"Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de me ser e se não fosse a sempre novidade que é escrever eu me morreria simbolicamente todos os dias" (Clarisse Lispector - A Hora da Estrela)

sábado, 13 de novembro de 2010

Absurdos e mais absurdos!

A cada dia a estupidez humana me deixa mais abismada. Tudo bem, eu sou estúpida em diversas ocasiões também, erro como todo mundo e muitas vezes ajo como uma completa imbecil. Mas não sou desprovida de consciência sobre esses meus atos. Eu sei reconhecer perfeitamente quando faço alguma idiotice. Mas a maioria das pessoas não.
A última da vez foi proibir a distribuição do livro “As caçadas de Pedrinho”, de ninguém menos que Monteiro Lobato, nas escolas públicas. A desculpa para essa decisão ridícula da comissão de babaquices literais é que o livro incita as crianças a serem preconceituosas e estimula o racismo entre os meios infantis. Além do uso de palavras como “TREPAR” ou “PRETA”
A verdade é que meu pai leu esse livro pra mim quando eu ainda era menina, e confesso que a pouco tempo eu reli toda a obra do Sítio do Pica-pau Amarelo. Livros que sempre me fascinaram e mesmo agora me ensinaram lições de que eu nem imaginava. Alguém aí, da minha geração, lembra-se de ter tomado alguma atitude racista em parte da vida e ter acusado a Emília ou o Tio Barnabé por tal ação? Pelo amor de Deus! Até onde vai nosso hall de desculpas esfarrapadas pro desrespeito de nossos filhos? Monteiro Lobato não tem nada a ver com isso não!
Vocês aí que concordam com esse tipo insano de proibição contra o “Caçadas de Pedrinho”, sabe por um acaso o quanto Monteiro Lobato foi importante pra história do nosso país? Aposto que não. Pois além de escritor ele foi um homem a frente de seu tempo, sendo inclusive o precursor da descoberta do petróleo no Brasil. Foi por isso, considerado um louco e preso, porque ameaçava com suas idéias inovadoras o conservacionismo do governo de Getúlio Vargas; por conta própria foi à procura desse tesouro, que é hoje, uma das nossas maiores riquezas, digna de exportação e tudo o mais. Peraí né? Deu uma ligada na cabeça do cara? Mesmo assim continua achando que seu livro é uma afronta aos direitos humanos, a igualdade entre as raças ou qualquer outra babaquice como essas?
Então lá vai outra das boas. Sabe de que época é o livro? De 1933, uma época em que nem se falava de direitos iguais, e que os negros realmente eram tratados como negros. Meu Pai Amado! Essa época existiu gente! E faz parte da nossa história também, não é só porque é considerado uma vergonha no currículo do país que se dá pra apagar. O preconceito sempre existiu, e eu tenho certeza que muitos negros sentem orgulho de seu passado. Eu sentiria. Credo, parem de tratar os negros como se fossem uns coitadinhos, é aí que se começa a diferenciação, quando se trata diferente, já se supõe que é superior. O preconceito está encravado na sociedade. Não é Monteiro Lobato com seu livro infantil educativo, ouviu? E-D-U-C-A-T-I-V-O, que vai influenciar a criançada não.
Minha mãe, e olha que nem sou tão velha assim, me dizia quando criança que se eu bebesse muito café acabaria ficando preta. É isso aí, preta! Isso em meados de 1993, qual é o problema de se falar isso em 33? Faz parte da nossa cultura galera, quem é que nunca ouviu isso? Era como se dizer que se mexer com fogo faz xixi na cama, ou que se engolisse chiclete a gente ficaria com a barriga grudada. Dá até vontade de rir quando me lembro disso. Enfim, o que eu quero dizer é que ouvindo essas besteiras que minha mãe falava, ou lendo Monteiro Lobato, eu nunca desenvolvi nenhuma espécie de mente racista ou preconceituosa. Isso está mais ligado à educação que nossos pais nos oferecem do que os livros que nós lemos.
Daqui a pouco, vão querer reescrever os livros de Monteiro Lobato, assim como já modificaram em algumas escolas cantigas populares de Villa Lobos. Eu disse Villa Lobos! Até onde vão os absurdos? Até onde o nível de babaquices dos brasileiros pode suportar? Vão trocar descrições até do Saci, ao invés de dizerem que é um “Negrinho de uma perna só que fuma cachimbo” vão querer dizer nos livros que é um “Afro-descendente portador de necessidades especiais e não se envolve com nenhum tipo de drogas”!
Eu fico até sem palavras e me chego a arrepiar de pensar em tais coisas e saber o quão próximo isso está de acontecer. Depois da proibição de um livro tão importante na vida de tantas crianças, como foi na minha, depois de mudar letras de músicas de Villa Lobos, como a “O Cravo Brigou com a Rosa”, que na nova versão, não briga mais, o que mais falta acontecer?
Por querer fabricar nas escolas robozinhos inocentes e desprovidos de qualquer conhecimento sobre a vida real, pois pra mim tudo isso faz parte da realidade em que vivemos, estão matando aos poucos a cultura do nosso país, a história do nosso país. Qual é o legado que estamos deixando para os nossos filhos?
O maior censo de respeito e igualdade a todo ser vivente que podemos legar as nossas crianças, vem, na minha humilde opinião, da educação que damos a elas, através de ensinamentos de ética e convivência social. Não vem dos livros que lemos e nem das cantigas que cantamos nas rodas de ciranda. Isso é um absurdo e uma total ignorância.
Vou ter o imenso prazer, de um dia, ler pros meus filhos toda a obra infantil de Monteiro Lobato, inclusive, as Caçadas de Pedrinho; brincar com eles em uma roda de ciranda cantando “O Cravo Brigou com a Rosa”, sim senhor! Assim como meus pais fizeram comigo, e meus avôs por sua vez fizeram com eles. E viva a cultura brasileira!

2 comentários:

  1. Maurinhaaaa ! Adorei o que você escreveu. Concordo plenamente. E viva a cultura brasileira ! =)

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  2. Maura, você escreve muito bem e tem uma visão excelente!! Concordo com o que escreveu e espero que as pessoas possam através de textos como o seu valorizar mais a nossa cultura e principalmente transmití-la! Viva!!

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